Nesta crise os líderes precisam tomar decisões difíceis, apoiando-se em algo que eles confiam. No papel de líderes nós temos diferentes “partes”, que podem nos dominar e nos tirar do equilíbrio. A COVID-19 irá demandar muitas decisões sísmicas, que terão enormes significados éticos e sociais, o que significa que enquanto líderes, precisamos nos aprofundar ainda mais para descobrir quem realmente somos.
Com este intuito, eu gostaria de compartilhar com você um conceito desafiador, que pode criar confiança dentro da sua organização e reabastecer suas energias. Recentemente os psicólogos começaram a falar do conceito de “multiplicidade”, nos vários “eus” que compõe nosso mundo interno. Nós sabemos que temos múltiplas identidades; por exemplo, na quarentena você pode ser um CEO ajudando seus filhos a estudar e cuidando das necessidades deles no papel de pai ou mãe. Mas no nível mais profundo nós também temos personalidades internas, que o psicológico Dick Schwartz chamou de “partes” dentro de nós – literalmente, personalidades únicas ou partes dentro de nós, cada uma com suas próprias motivações, emoções e sentimentos. Os líderes precisam estar conscientes de quais de suas “partes” estão ativadas e influenciando suas decisões mais importantes. Quando os líderes conseguem se separar ou se distanciar de suas partes, e consequentemente se conectarem com quem realmente são, eles estão capacitados a liderar esta crise com um propósito maior.
O que eu quero dizer com isso? Talvez você esteja identificado com uma parte “agradadora”, que demonstra grande dificuldade em tomar decisões difíceis. Ou com um “controlador obsessivo”, que domina as suas decisões. Como você poderia ter esta informação? Como CEO, talvez você tenha voltado a funcionar a partir do modelo “comando e controle”, esquecendo-se dos conceitos de desenvolvimento de liderança e dos recursos de seus colegas. Você pode estar pensando – “Esta é uma crise; eu preciso estar no controle”. Obviamente que não é verdade, mas uma parte em você precisa, apenas uma parte. Ou então você está identificado com suas “partes amedrontadas”, e se comportando de forma indecisa; talvez estas partes estejam amedrontadas devido a situações do passado. Neste momento, elas precisam ser reconhecidas e cuidadas de forma amorosa, e não deixadas a sós, sem controle. Também pode existir uma parte com um estilo “pavio curto”, ou “durona” e inflexível? Ou o oposto, uma parte catastrófica, que espalha medo e não tem esperança de um futuro melhor ou possibilidade de receber ajuda. Pergunte-se: que “partes” sequestraram a sua consciência levando em conta a maneira como você tem exercido a sua liderança nesta pandemia?
Contudo, nós não precisamos ser apenas um conjunto de partes brigando pelo controle. Se você conseguir criar espaço internamente, aquietando o diálogo conflituoso, poderá descobrir este centro, um espaço calmo que chamamos de essência ou consciência.[1] A essência do líder pode aprender a “conduzir a orquestra” ao consolar, domar e negociar com as diferentes partes. Ao tomar decisões sísmicas, a essência do líder precisa estar no comando.
Você pode sentir a presença da essência ou consciência. Em nossos programas de desenvolvimento para CEOs, conjuntamente com a Mobius, nós vemos alguns líderes funcionando no automático, como máquinas sem alma, se comunicando de forma rude e julgadora. É impressionante perceber como eles descobrem a conexão com a essência. E a boa notícia é que todos temos esta possibilidade. Mas estamos vendo muitos líderes nesta pandemia desconectados de suas essências, na maior parte do tempo. Deixe-me então te fazer uma pergunta: você realmente confia em sua essência? Como você poderia saber se é verdade?
Você tem se sentido centrado nesta crise, com maior capacidade de equilibrar coragem e compaixão? Você tem se sentido mais lúcido, mais animado e ainda mais alinhado com seus princípios? A sua presença como líder criou mais harmonia do que você poderia imaginar? Descobriu um espaço criativo e de mais possibilidades dentro de você? Estes fatores indicam que você está conectado com a sua essência. Esta pode trazer calma e tranquilidade para você e sua organização, criando confiança e aumentando a criatividade e a esperança. A sua essência poderá ajudá-lo a navegar os paradoxos e desafios da COVID-19.
E mais importante, a essência está conectada, de forma universal, a algo maior do que nós; ela nos inspira a realizar aquilo que a sociedade está precisando. Ela tem a qualidade da consciência mais expandida, que sabe o que é o certo a fazer. Você já ouviu pessoas dizerem que se sentem profundamente gratas e abençoadas? A conexão com a nossa essência revela o melhor em nós. Mas, se perdemos a conexão com a essência ou consciência maior, o medo se alastra rapidamente. Contudo, a essência pode ser mais contagiante e fazer você sentir a sua vibração. Isto é o que a sociedade necessita de seus líderes neste momento.
Mas o que você precisa? Provavelmente iremos experimentar muitas ondas de COVID-19. E neste momento muitos líderes já estão num estado de esgotamento. Lutar com partes polarizadas, em conflito umas com as outras, tende a drenar nossas energias. Ao passo que ao nos conectarmos com a essência nos nutrimos de energia, nos recarregamos. Talvez você já tenha tido esta experiência nas práticas de meditação ou mindfulness. Desta forma, a nossa recomendação é que você comece a notar as suas partes e permita que a essência lidere.
Nós já falamos sobre a grande capacidade de realização e conhecimento dos líderes. Mas ser um verdadeiro líder nasce da conexão mais profunda, e da capacidade de permanecer mais tempo, conectado com a essência.
Muitos de nós está se perguntando: como iremos sair deste confinamento? Toda uma organização pode se conectar com a sua essência, se o líder principal também estiver. O mundo precisa do “cuidado em grande escala” de seus líderes. Isto nos mostra qual o caminho para conquistar verdadeiros seguidores e alcançar a renovação da concessão da sociedade para continuar funcionando.
Nesta pandemia, o que realmente importa é quem demonstra a verdadeira liderança. E a essência é a referência legítima, a partir da qual o líder pode tomar decisões sísmicas.
Fiquem bem.
[1] Em inglês “Self”, a dimensão central e mais profunda da nossa personalidade.
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